segunda-feira, 25 de maio de 2020

Ovelhinha - Gondar

OVELHINHA

a magia de uma aldeia

O topónimo Ovelhinha deriva de Ourelinha, diminutivo de ourela que significa estreita faixa de terreno na orla de um rio. É isso que Ovelhinha é: uma idílica aldeia a beijar o rio Fornelo.

Lugar de Ovelhinha - Gondar
Mas Ovelhinha não é apenas o casario e o rio com as suas  pequenas pontes e velhos moinhos. Ovelhinha é também história. História da crueldade dos soldados de Napoleão que velhos pardieiros ainda testemunham. História de um passado senhorial que um solar e sua capela evidenciam. História do trigo de cantos que todos adoramos e teve aqui as suas origens.
Ovelhinha tem, ainda, a Senhora do Carmo com seu belíssimo retábulo em talha dourada; e Santo Amaro com sua festa de sabor carnavalesco, onde o sagrado e o profano convivem pacificamente. E tem uma escola, mas não uma qualquer escola. Tem uma escola linda, centenária, do tipo Adães Bermudes, de boa memória para muitos de nós.
Ovelhinha é, por tudo isto, uma aldeia repeleta de encantos e de histórias que vale a pena desvendar. Percorrê-la vagarosamente, descobrir os seus recantos, sentir os seus cheiros, observar o estilo de vida calmo e tranquilo dos seus habitantes é algo que nos enleva os sentidos e nos acalenta a alma.
Não desperdice o convite e venha desfrutar esta dádiva da natureza.

Miguel Moreira

quinta-feira, 21 de maio de 2020

Memória Paroquial de Santa Maria de Gondar - Amarante


GONDAR EM 1758


A “Memória Paroquial de Gondar”, descrita pelo P.e António Coelho Pedroza, a 20 de Março de 1758, é, porventura, o mais importante documento para a história de Gondar, no século XVIII.
Transcrevemos alguns excertos desse valioso documento (manuscrito):

“Descriçom desta Freguezia de Sancta Maria de Gundar, feita pelo encomendado della António Coelho Pedroza, natural da Villa de Murça, desta Comarca de Villa Real.

1. He esta Freguezia da Província de Entre Douro e Minho, do Arcebispado de Braga Primaz, da Comarca de Villa Real, do Concelho de Gestaço.
2. Sua Magestade que Deos guarde he senhor della.
4. Está esta Freguezia situada entre montes com distância do Marão duas légoas e tão baixa que della se não descobre povoaçom alguma.
5. He esta Freguezia membro do Concelho de Gestaço.

Lugares
“Os povos de que se compõe o corpo desta Freguezia sam – Mosteiro, Aldea, Larim, Vau, Palmazões, Real, Curjeiras, Outeirinho, Rio, Villa Seca, Valinhas, Villela, Crispellos, Areas, Salida, Quintam”.

População
“Tem esta Freguezia, conforme o rol dos confessados que nella achei, duzentos e vinte fogos, pessoas de sacramento seiscentos e trinta e huma, menores sessenta e oito”.


Igreja do Mosteiro de Gondar - Amarante

Igreja do Mosteiro
“A Igreja desta Parochia esta em huma das bordas da Freguezia em hum dos povos della que lhe chamamos o Mosteyro, cuja dominaçom tomou por ser nos séculos passados de Religiosas Beneditinas, que consta por tradiçom fazer constar de muitos archivos.
Seu orago he de Sancta Maria de Gundar, tem três altares, o mor donde se conserva o Sacrário com o Santíssimo Sacramento, e dois colaterais, o da parte direita do santo Nome de Jezus, e da parte esquerda do Senhor Sam Sebastiam; tem huma Irmandade das Almas.
Nesta Parochia muito antigua há hum campanário com seus sinos de vox muito suave e sonora quando convidam os freguezes à palavra de Deos e a ouvir missa, mas triste e fúnebre quando os chama à sepultura. O mais piqueno conserva ainda hoje o seu timbre porque foi sempre pouco gasto; o maior foi bello contralto, mas hoje por quebrado ficou em tenor desentoado, mas nas festas sempre participa de sua glória quem os repica”.

Capelas
“Tem esta Freguesia sinco capellas, huma da Freguesia que ademenistra o Excelentíssimo Conde de Redondo como Comendador e senhor dos frutos desta comenda, cujo orago hé Santo Amaro, em cujo dia acorrem a sua capella muntos devotos das vizinhanças com suas esmolinhas.
No lugar de Ovelhinha tem huma capella muito moderna feita a expensas do Doutor Manuel Pereira Valente, natural desta Freguesia e assistente na cidade do Porto pella sua grande Literatura …
Tem outra no lugar da Salida com  invocaçom do senhor Santo António que mandou eregir o Padre  Gonçallo Nunes Pereira Valente, vigário de Sam Martinho de Carvalho de Rei.
No lugar de Vilella há duas capellas, huma a mais antiga seu orago Sam João Baptista de que hé adeministradora Brizida Preira veuva e seus filhos o licenciado Manuel Brochado e o padre frei Joam de Sam Joam Baptista religiozo da Observância do Seraphico Sam Francisco na província da Índia. A outra de Sam João Crisóstomo que há poucos annos  mandou eregir o Padre João Pereira Sobrinho”.

Feiras
“Tem esta Freguesia três feiras no anno, aos dezassete de Novembro, de Setembro e Janeiro, que só consta de javalis mansos e algumas cousas comestíveis, e outra do mesmo no dia do senhor Santo Amaro, a quinze de Janeiro, e todas francas”.

Geografia
“Toda esta Freguezia he composta de bosques, penhascos, outeiros, ribanceiras e arvoredos frutíferos, de espinho e silvestres...

Rio / Pesca
"O rio... hé rico em trutas excelentes, algumas de suficiente grandeza, bellos escalos, estupendas bogas e peixinhos...
Não tem pesqueira particular, hé comum todo o anno, e por isso percorrido por vários pescadores de chumbeira, redes de arco, tresmalhas e barredouras".

Moinhos e outros engenhos
“Tem vários moinhos alveiros (trigo) e broeiros (milho), nenhum lagar de azeite, nem pizão, nem nora, nem outro algum engenho...

Estradas
“Por esta freguesia passa uma estrada do nascente ao poente, tão povoada de passageiros pedestres e equestres que com eles se comunicam não só o nosso Reino, mas também toda a Castela Velha e nessa com todas as suas Províncias, Reinos e cidades, mas também a França, a Itália, a Palestina ou Roma”.

Pontes
Tem nesta freguesia uma ponte que chamam de Larim, de cantaria, terá de comprido um tiro de mosquete, tem quatro arcos, da parte superior tem três cortamares com que se defende nas enchentes; na inferior três baluartes...

Data e assinatura do documento

Notas: Os títulos a negrito são acrescentos da minha responsabilidade.
Mantivemos a ortografia do documento.
Miguel Moreira

segunda-feira, 18 de maio de 2020

A Torre da Lagariça e os Gundares


A TORRE DA LAGARIÇA E OS GUNDARES


Imortalizada por Eça de Queiroz, no romance “A Ilustre Casa de Ramires”, a Torre da Lagariça esteve associada, durante muito tempo, à linhagem dos Gundares.

Torre da Lagariça, em Resende
Um filho de Mem Gundar, Egas Mendes de Gundar, casou com Maior Pais Pinto, filha de Paio Soares Pinto, senhor de muitos bens nas Terras da Feira. O seu filho Gonçalo Rodrigues Pinto dá continuidade à família “Pinto” e passa a habitar a “Torre da Chã, em Riba de Bestança (Cinfães). No século XVI adquirem a famosa Torre da Lagariça.
Brasão dos "Pinto" na Torre da Lagariça
Edificada na primeira metade do Século XII, a Torre da Lagariça, um robusto torreão militar de planta quadrada, tinha com principal função a defesa da linha do Douro, servindo de torre de atalaia. Porém, com o avançar da Reconquista para o sul, a sua função estratégica e militar foi perdendo significado e, como tal, foi adquirida no século XVI pela família Pinto, descendente dos Gundares e senhores da Torre  da Chã e do Paço de Covelas. A Torre permaneceu na posse dos "Pinto" até 1610, data em que foi adquirida pelos Pinto Cochofel, atuais proprietários, que lhe acrescentaram o solar e a tornaram residência da família.
Em adiantado estado de degradação, o imóvel encontra-se à venda, por incapacidade dos seus proprietários realizarem as obras necessárias.

Miguel Moreira

quarta-feira, 13 de maio de 2020

Ponte de Larim - Gondar

A PONTE DE LARIM


No lugar de Larim, esta ponte, mandada construir por Filipe III, em 1630, veio solucionar o velho problema da travessia do rio Ovelha, já que, até essa data, essa travessia era feita por um “vau” – sítio pouco profundo do rio por onde era possível passar a pé ou a cavalo. Daí a designação, Lugar do Vau, por que era conhecida a localidade na margem esquerda do rio. Larim era a designação do lugar na margem direita.


Ponte de Larim em Gondar - Amarante
Remonta à romanização uma via que, a partir da via romana Tongobriga-Panóias, passaria por Larim rumo às minas do Teixo, no Marão. Esta via atravessava Gondar, em Vila Seca subia a Bustelo e continuava por Corvachã em direcção às minas (1). Estes caminhos mantiveram-se praticamente inalterados, ao longo de toda a Idade Média.
Na Idade Moderna assiste-se a um incremento das ligações a Trás-os-Montes e às Beiras e daí a Castela. Do Covelo (Arquinho), partiam duas estradas em direcção ao interior: uma para Trás-os-Montes (pela rua da Madalena, Lufrei, Marancinho, Ovelha do Marão e Campeã), e outra para as Beiras. Esta, pela rua do Cabo, subia Padronelo, atravessava Gondar, subia a Bustelo e, por Carneiro e Teixeira, dirigia-se ao Douro. Note-se que a estrada pombalina só é construída em finais do séc. XVIII pela Companhia dos Vinhos do Alto Douro.
É neste contexto de incremento das comunicações terrestres que Filipe III manda construir, em 1630, as pontes de Larim e Ovelha do Marão: a de Larim na estrada para o Douro e a de Ovelha do Marão na estrada para Vila Real.
Assim, a três de Julho de 1630, Filipe III adjudica a obra ao mestre e arquiteto João Lopes de Amorim, morador na cidade de Guimarães, pelo valor de sete mil e quinhentos cruzados. (2)
Em 1758, na Memória Paroquial de Gondar, redigida por António Coelho Pedrosa, Reitor de Gondar, a ponte é descrita nos seguintes termos: “tem nesta freguesia uma ponte que chamam de Larim, de cantaria, terá de comprido um tiro de mosquete, tem quatro arcos, da parte superior tem três cortamares com que se defende nas enchentes; na inferior três baluartes...”. E, no mesmo documento, diz-se: “por esta freguesia (Gondar) passa uma estrada do nascente ao poente, tão povoada de passageiros pedestres e equestres que com eles se comunicam não só o nosso Reino, mas também toda a Castela Velha e nessa com todas as suas Províncias, Reinos e cidades, mas também a França, a Itália, a Palestina ou Roma” (3). Daqui podemos avaliar a importância desta estrada, tanto no contexto regional como internacional.
Em 1867, aquando da construção da nova estrada real para Vila Real (EN 15), que vem substituir a velha estrada por Marancinho e Ovelha do Marão, o tabuleiro da ponte é adaptado às condições da nova via. Esta data encontra-se inscrita na base dos pedestais NO e SE, de cada lado da ponte (OP-1867). (4)
Mais recentemente, em 2010, o tabuleiro é novamente alargado para possibilitar o cruzamento de veículos.

Ponte de Larim, em Gondar - Amarante
Descrição da ponte:
Ponte em granito, com quatro arcos de volta perfeita, iguais, com aduelas estreitas e compridas de formato regular, sustentadas por pilares, os dos extremos assentes nas margens. Os pilares centrais são protegidos por talhamares, a montante, e por talhantes, superiormente escalonados, a jusante.
Guardas em gradeamento de ferro assente em cornija, apresentando nos encontros pedestais encimados por plinto galbado e elemento ovóide. Dois dos pedestais, NO e SE, apresentam na face frontal inscrição moldurada OP-1867 (data da adaptação do tabuleiro a estrada real).
Mestre pedreiro: João Lopes de Amorim (da cidade de Guimarães).

Miguel Moreira
2)- Sousa Viterbo, “Dicionário Histórico e Documental dos Arquitectos, Engenheiros e Construtores Portugueses”, 3 vol.s, INCM, Abril de 1988.
(4)- https://memgundar.blogspot.com/search/label/EN%2015

terça-feira, 5 de maio de 2020

Corujeiras - Gondar


LUGAR DAS CORUJEIRAS


“Pequena povoação em lugar penhascoso” ou “aldeia situada num lugar escarpado, próprio das corujas”, é assim que os dicionários definem Corujeira.
Topónimo de origem geomorfológica, o nome Corujeiras deriva das semelhanças que existem entre a morfologia do terreno do lugar e as características dos locais onde as corujas costumam viver e nidificar: sítios altos e escarpados.
Lugar de Corujeiras - Gondar
Corujeira também significa lugar pobre e de poucos recursos, precisamente porque se situa entre duas escarpas. E, é isso que acontece com o lugar de Corujeiras, em Gondar. Porque de fracos recursos agrícolas, a sua população teve de se dedicar a outras atividades, designadamente à olaria. Em 1830, em Corujeiras trabalhavam 17 oleiros, do total de 77 na freguesia. E em 1945, apesar do declínio da arte, a olaria ainda era uma das principais profissões do lugar ocupando seis chefes de família, a saber: António Ribeiro Peixoto, José Ribeiro, José Ribeiro Félix, Manuel Bernardes Nunes, Manuel Pereira Andreso e Salvador Ribeiro Moutas.
Um dos lugares mais antigos da freguesia, Corujeiras mantém, nos dias de hoje, a mesma configuração que sempre teve: uma rua única, estreita e sinuosa, com as casas alinhadas de um e outro lado do caminho. É esta a sua singularidade.

Miguel Moreira

segunda-feira, 4 de maio de 2020

Pelourinho de Ovelha do Marão

O PELOURINHO E O CRUZEIRO DE ABOADELA


O surgimento dos pelourinhos está intimamente associado à criação dos concelhos. À outorga de um foral a uma comunidade local segue-se, normalmente, o levantamento de um pelourinho, símbolo da sua personalidade jurídica e da sua independência. Invariavelmente é implantado numa praça ou num largo central da povoação e em frente ao edifício dos Paços do Concelho.
A renovação dos forais efetuada por D. Manuel I é frequentemente associada ao fulgor construtivo de pelourinhos verificado no século XVI (1). Considerando que, em 1514, D. Manuel concede novo foral a Ovelha do Marão, e, em 1550, D. João III transformou a Beetria em Honra, a Casa da Câmara e o pelourinho devem ter sido construídos por essa altura. Também se depreende que a primeira Câmara de Ovelha terá sido próxima da ponte, onde se encontra o pelourinho, e não no edifício ao cimo da rua, construído em meados do século XVIII pelos Morgados de Mateus. Em 1726, Craesbeeck escreveu o seguinte: a Honra de Ovelha “tem sufficiente caza de câmara, perto da ponte, por onde se passa o dito rio, dentro do lugar, com sua cadea e pelourinho”. (2)


Pelourinho e Cruzeiro de Ovelha do Marão - Aboadela
O pelourinho de Ovelha do Marão levanta-se num pequeno largo da freguesia, junto à ponte, sobre plataforma de cinco degraus quadrangulares. A coluna é composta por grossa base circular e fuste cilíndrico e liso. Este é rematado por capitel constituído por uma peça tronco-cilíndrica, encimada por ábaco em tabuleiro, formado por três molduras quadradas crescentes. No topo assenta uma pirâmide de secção quadrangular. (3)
Na coluna são visíveis marcas dos furos onde seriam engatados os ferros de sujeição. O pelourinho, símbolo concelhio e instrumento penal, era o local onde se aplicavam as penas. Os presos eram amarrados às argolas e açoutados ou mutilados, consoante a gravidade do delito e os costumes da época.
Pelo Decreto n.º 23 122, DG, 1.ª série, n.º 231, de 11 de outubro de 1933,  o pelourinho de Ovelha foi classificado como IIP-Imóvel de Interesse Público. 

 Adossado ao parapeito da ponte, na margem esquerda do rio, encontra-se o cruzeiro. É constituído por um plinto de planta quadrada, com a inscrição “1630 / RMO” na face frontal, e moldura superior em quato de círculo invertido com encaixe central para o fuste cilíndrico liso. O capitel é em forma de esfera achatada, sustentando uma cruz latina lisa, de secção circular.
A data, 1630, inscrita na base do cruzeiro, poderá ser a data da (re)construção da ponte. E porquê? Porque coincide com o reinado de D. Filipe III, que governou entre 1621 e 1640, que foi um dos monarcas que mais contribuiu para a construção de pontes e estradas. A de Larim, em Gondar, terá sido construída pela mesma altura.
Os cruzeiros, símbolos de jurisdição paroquial, estavam, muitas vezes, associados às pontes, como era o caso da ponte de S. Gonçalo, em Amarante, que tinha um cruzeiro a meio. O cruzeiro, nestes casos, simbolizava a protecção aos viajantes e romeiros e à própria ponte. Refira-se o facto de Amarante ser, na Idade Moderna, o epicentro de várias vias para diversos centros espirituais regionais, como São Gonçalo, Santa Senhorinha de Basto, Senhora da Lapa ou mesmo na ligação aos caminhos de Santiago de Compostela.

(1)- Rosa, António Manuel Amaro, Os Pelourinhos da Lusitânia, Universidade Aberta, Lisboa, 2014, p. 13.
(2)- Craesbeeck, Francisco Xavier da Serra, Memórias Ressuscitadas da Província de Entre Douro e Minho n ano de 1726, Edições Carvalhos de Basto, vol. II, p. 311.

Miguel Moreira