quarta-feira, 21 de março de 2018


MOSTEIRO DE SANTA MARIA DE GONDAR 
(EM 1726)


por F. X. da Serra Craesbeeck (1)

“1- A igreja de Santa Maria de Gundar foi antiguamente mosteiro de religiosas de São Bento; e, em tempo de El Rei D. Affonso Henriques, se acha D. Teresa Lourenço, Abbadeça de Gundar, da qual trata o Conde D. Pedro, e foi filha de Lourenço Mendes de Gundar, de que trata a “Monarchia Lusitana”, o qual foi filho de Mem de Gundar, capitão do dito Conde D. Henrique, de quem faz menção, o livro do dito Conde D. Pedro e a “Monarchia” supra. Este mosteiro se conservou por muitos annos, tendo dous mosteirinhos subordinados, que eram Santa Maria Magdalena de Covello e São Salvador de Lufrei, dos quais faz menção a “Beneditina Lusitana”. Durou este mosteiro por muitos annos, sendo ultimamente Abbadeça delle Ignes Borges, como se vê hume verba do registo de Braga em tempo do Arcebispo D. Fernando da Guerra, que por ter faculdade pontifficia para reduzir a igrejas parochiais alguns mosteiros, apresentaram neste a Pedro Affonso, clérigo de missa, no anno de 1455. Refere assim a “Beneditina Lusitana”, asima alegada, nestas palavras:

Aos 13 de Abril de 1455, em Lisboa, confirmou o Arcebispo a igreja de Santa Maria de Gundar da terra de Gestaço a Pedro Affonso, clérigo de missa: apresentação do dito Arcebispo e sua igreja de Braga; a qual vagou por morte de Ignes Borges, Dona Abbadeça que foi da dita igreja, sendo mosteiro de São Bento; e o dito Senhor fez redução della de mosteiro em igreja secular.

Igreja do Mosteiro Beneditino de Gondar - Amarante

2- Hoje he esta igreja reitoria e comenda da Ordem de Christo, de que he Comendador Thomé de Souza Coutinho, 2º Conde de Redondo e reitor o Padre Domingos Ferreira da Silva; tem sacrário e huma capella fillial de Santo Amaro, em o lugar de Ourelinha; nesta igreja se achão alguns letreiros de que faremos menção; e alguns ouve antiguamente, que já não existem; como foi hum, que estava no arco da capella-mor, que antiguamente era muito baixa, e nelle estava huma imagem do Senhor Cruxificado, São João e Nossa Senhora, nas ilhargas; e por baixo, em roda do dito arco, hum letreiro gothico, que desia o seguinte:
ESTE CRUZEIRO MANDOU PINTAR O FILHO DO DUQUE DE BRAGANÇA
Este duque foi D. Jaime, filho de D. Jaimes, 4º Duque de Bragança que foi comendador desta comenda no anno de 1548, por cuja ordem e procuração foi então feito tombo della, e por despacho do Provisor de Braga, o Licenciado Sebastião Gonçalves em tempo do Arcebispo D. Manuel de Souza.

Igreja Românica de Gondar - Amarante (interior)

3- Na capella-mor, estão as seguintes campas, que são as que só hoje se conservão com letreiros:

1.ª       AQUI. ESTÁ. / SEP(ULTA)DO. M(ANU)EL, CER/Q(UEI)RA. PRETO
             REI/TOR. DESTA. / IGR(EJ)A. COM. SUA. / MAI. M(ARI)A. CER/Q(UEI)RA. 1620.

2.ª       AQUI. ESTA. S/EPULTADO. / GASPAR. S/ARAIVA. PIN/TO. REITO/R.

4- Na parte de junto ao altar collectral está pintado São Brás, e por baixo delle este letreiro pintado.

            AQUI. NESTA. SE. DIZE. DUAS. MIS(S)AS. / TODAS. AS. SOMANAS. HU(M)A. PELOS.
            BEMFEITORES. DA IGREJA. E OUTRA. / DE FIDELIUM. DE(FUNCT)US. NAS. SEGUNDAS
            F(EIR)AS. E OUTRA. A / NOSSA. S(ENHOR)A. AS CUAIS. PAGUA. O COMEMDADOR.

(1)   in CRAESBEECK, F. X. da Serra, “MEMÓRIAS RESSUSCITADAS da Província de Entre Douro e Minho No Anno de 1726”, vol. II, pp. 55-57, Edições Carvalhos de Basto, Ponte de Lima, 1992.                 

segunda-feira, 5 de março de 2018


MEMÓRIA PAROQUIAL DE LUFREI (1758)

(AMARANTE)

Sendo o Mosteiro de monjas bentas de Lufrei um dos três cenóbios fundados por Dom Mem Gundar e um dos dois subordinados à Abadessa do Mosteiro de Gondar, achamos por bem publicar o texto da "Memória Paroquial de Lufrei", importante documento histórico, datado de 1758. 
Da leitura da "Memória" permito-me salientar o facto de Fridão ser apenas um lugar da freguesia de Lufrei e, como curiosidade, o lugar da Mota ser meeiro com a freguesia de Santo Estêvão de Vila Chã, "de sorte que os seus moradores com um ano a que dá princípio o S. João pertencem a uma igreja e em outro ano à outra".
Diz o seguinte o referido documento:

"A freguezia de Lufrey fica na Provincia do Minho, he hua das do concelho de Giestaço em que há Juiz Ordinário. Pertence pelo secular à Comarca de Guimarães: e pelo eclesiástico he da Comarca de Villa Real do Arcebispado Primaz. He anexa à comenda de Santa Maria de Gondar da Ordem de Cristo de quem he actual Comendador o Conde do Redondo.
Há nesta freguezia cento e cincoenta fogos ou vizinhos: Tem pessoas mayores = quatrocentas e noventa = e menores = cincoenta e duas.
Está situada em Montes; e nas várias quebras que este forma se colhe todo o género de pão, linho, vinho, azeite, e castanha, e se crião boys, vaccas e ovelhas, e produziria também todo a variedade de frutas se nos moradores houvera a curiosidade de as plantar.


Igreja Românica de Lufrei - Amarante

Está a igreja em hua baixa cercada de outeiros e junto della, além da Casa do Parocho, só há três moradores, e deste sítio apenas olhando ao poente se descobre o Monte e a Hermida que no seu alto tem, de Santa Cruz, que dá nome ao seu concelho, e no mesmo Monte a Igreja Abbadia de Louredo, e também a Vigariaria de Fregim, que he comenda dos Cavaleiros de Malta, e dista o dito monte e Hermida hua légoa grande.
Compreende esta freguezia = o Lugar do Assento = o Lugar do Ribeiro = o Lugar de Villa Nova = o Lugar de Moure = o Lugar de Gatiães = o Lugar de Penim = o Lugar de São Tiago = o Lugar de Frariz = o Lugar de Fridão = e além destes = o Lugar da Motta com a especialidade de ser meeyro com a freguezia de Santo Estêvão de Villa Chã: de sorte que os seus moradores com hum anno a que dá princípio o S. João pertencem a hua igreja e em outro anno à outra.


Altar Mor e Colaterais da Igreja do Salvador de Lufrei - Amarante

O Orago desta freguezia he o Salvador, e tem a sua Igreja o Altar Mor e dous colaterais, hu com imagem de Nossa Senhora do Rozario, que tem sua confraria, e o outro com a imagem de São Sebastião.
Não tem naves, só sim duas confrarias mais, hua do Santíssimo Nome de Deos, e outra dos Fieis de Deos.
O Parocho desta Igreja he Vigário Collado, cuja prezentação pertence aos Reitores de Gondar, como Matriz da Comenda. E como a mayor parte dos seus rendimentos consistem em incertos, andam estes por cem mil ou mais dez menos dez. Também tem hu coadjutor annuo pago pelos fructos da Comenda, a quem se dá oito mil e seis centos só em dinheiro, e vinte alqueires de pão.
Não trem esta freguezia Beneficiados, Conventos, hospital, nem Caza da Misericórdia. Tem sim quatro Hermidas de que se administrão os sacramentos aos moradores dos lugares em que se achão. A primeira he a do Salvador do Mundo em o lugar de Gatiães; a segunda a do Arcanjo São Miguel em o lugar de Moure; a terceira a de São Faustino em o lugar de Fridão; e estas três são da Administração do Parocho e fabricadas pelos fructos da Comenda. A quarta he de Nossa Senhora dos Prazeres, contigua a hua quinta que os Religiosos de São Gonçalo da Villa de Amarante tem no lugar de Frariz, a quem a mesma Hermida pertence e eles mesmo tem obrigação da sua fabrica.


Ermida do Salvador do Mundo - Lufrei
A esta quarta hermida acorrem algumas romagens principalmente em o dia dos Prazeres, que he na Segunda Feira depois da Dominga in albis, e neste Arcebispado he Dia Santo de preceito, em o qual dia vem os Religiosos de São Gonçalo cantar-lhe hua missa, e além de bastante concurso da villa de Amarante, e todos estes arredores, vem também a freguezia de Gondar em clamor por força do votto antiquíssimo. E do mesmo modo vem também a ella a freguezia de Santo Estêvão de Villa Chã em a segunda oitava do Espírito Santo.
A sobredita hermida  do Salvador do Mundo também em certos dias do anno acodem algumas romagens: como he em dia da Transfiguração, a 6 de Agosto, em que esta freguezia vai em clamor a ella, por votto muito antigo. Na primeira Terça Feira de Junho, também a freguezia da Madalena, vem a ela com seu clamor, e o mesmo observa também a freguezia de Gondar no dia de São Barnabé, a onze do mesmo Junho. E em todas as vezes que há esterilidade, necessidades de sol ou falta de chuvas, acodem todas as freguezias destes arredores, com os seus clamores, à dita hermida a suplicar a Deos Nosso Senhor, o que necessitam, e ordinariamente o conseguem.
Não há memória digna de crédito de que florescessem ou sahissem desta freguezia homens por qualquer respeito insignes, sendo que algum indício de que algum tempo os houve parece certos dando três túmulos de pedra inteira, que no adro desta Igreja se conservão, levantados da terra, com cobertas de pedra também inteira, lavradas em forma aguda por todo oseu comprimento, os quais se não achão por qualquer outra destas vizinhanças. 


Túmulo no adro da Igreja de Lufrei - Amarante

Em dous destes túmulos se devisão alguns religiosos de nome que se lhe abriu ao cizel, mas por que o tempo corrompeu as letras, não se pode já averiguar o que era, nem na memória dos homens há tradição de quem fossem os sujeitos que neles se sepultaram.
Não há nesta freguezia feira nem correyo, e se serve pelo de Amarante, que dista hum quarto de legoa. Desta freguezia a Braga são nove legoas e a Lisboa pouco mais de sessenta e duas.
Não padeceu ruina alguma com o terramoto, nem tem notabilidade ou couza que mais seja digna de memória.
A esta freguezia divide o Rio Tâmega pela parte do norte da freguesia de São João de Gatão e da de São Cipriano da Chapa, que são do concelho de Basto, e nas partes em que o dito rio confronta com esta minha freguezia tem três açudes, em duas dellas cada sua azenha e na outra hum moinho. Pertence este e ellas ao Cazal das Chouzas do lugar de Fridão, a outra ao Cazal do Monte do lugar de Frariz e a última à quinta de Paschoaes, que he da freguezia de Gatão. E porque em tudo o mais he o dito rio muito bem conhecido, não o refiro, nem acho de que mais dê informação".

Lufrey hoje 17 de Março de 1758
O Vig.º Joseph Ferreira da Sylva

Um trabalho de Miguel Moreira, a partir do manuscrito original existente na Torre do Tombo.