domingo, 29 de março de 2020

Lenda do Penedo dos Cornudos

LENDA DO PENEDO DOS CORNUDOS


Na localidade de Travanca do Monte, em Amarante, há uma rocha com fama de desvendar se a sua parceira lhe é fiel ou infiel: o penedo dos cornudos.

“Fiel ou infiel? A resposta, em Travanca do Monte, é dada por uma pedra: o Penedo dos Cornudos. Na fria e amorável aldeia de Travanca do Monte, na Serra da Aboboreira, há uma volumosa rocha granítica. Os mais velhos dão-lhe um nome curioso: Penedo dos Cornudos. Porquê? Porque lhes dá luz acerca da fidelidade ou infidelidade das suas mulheres.

Travanca do Monte - Amarante
Dizem as pessoas de maior idade que ali iam os homens saber se as mulheres se estavam a comportar de acordo com a promessa católica que fizeram.
Uma pedra que mexe? Poderá ser essa a explicação para as tradições que giram à volta do Penedo dos Cornudos. No que toca ao ritual feito, ouvi duas versões: uma primeira, que defendia que todo o rapaz que ali passasse teria de olhar o penedo de cima a baixo, e atirar-lhe um pedregulho para garantir que a esposa não lhe seria infiel; e uma segunda, que afirma que todo o homem deveria atirar um pedregulho, sim, mas que esse pedregulho teria de se manter em cima do penedo, e por cada um que caísse, essas foram as vezes em que a mulher tinha sido infiel.
Não querendo dizer que a primeira versão está errada, parece-me mais provável que a segunda fosse a mais verosímil de se agarrar às crenças de Travanca do Monte – não só por se assemelhar mais a ritos já vistos noutras terras portuguesas, como também pelo número de pequenas pedrinhas que, com alguma dificuldade, conseguimos contar no seu topo.
É difícil descodificar este rito que se instalou por aqui. Conheço vários penedos ao qual ficaram associadas tradições ligadas à fecundidade, mas sempre alimentadas por mulheres – já falámos da Pedra ou Rocha dos Namorados, no Alto-Alentejo, e conheço outro muito semelhante no caminho para o Santuário da Senhora de Anamão, em Castro Laboreiro.
No entanto, o Penedo dos Cornudos, sobretudo se visto pelo lado norte, enquadra-se naquilo que se conhece, em Portugal, como uma Pedra Baloiçante, ou seja, uma rocha que, naturalmente ou por mão humana, está colocada em cima de uma outra.
Nesse sentido, conseguimos construir pontes entre este afloramento de granito e alguns outros que se encontram nestas situações particulares. As Pedras Baloiçantes, pela forma que têm (a pedra superior mal se encaixa na inferior), são famosas por se mexerem caso lhes toquemos, e em muitos casos, a forma como se mexem é, nas crenças locais, anunciadora do futuro.
Há dezenas de exemplos, maioritariamente no centro e no norte do país, de rochas que, pelo movimento que fazem, dizem à pessoa que a empurrou qual a direcção do seu destino em relação a determinadas situações da vida – sendo a sorte, o amor, e a morte, os temas mais desejados de ouvir.
O Penedo dos Cornudos, embora pesadíssimo e por isso difícil de se mover, poderá ir buscar o ritual de anunciar a fidelidade ou infidelidade de alguém a essas pedras que baloiçam e decidem fados, localizadas um pouco por todo o país.

O Penedo dos Cornudos hoje

Penedo dos Cornudos - Travanca do Monte (Amarante)
Na verdade, quando perguntei por ele em Travanca do Monte, apenas a terceira idade mo soube apontar. Perguntei por ele a um senhor que guiava um tractor, que parecia andar pelos cinquenta anos de idade, bem como a um outro com aparência de quarentão, e ninguém percebeu do que é que falava.
Fiz o mesmo a duas mulheres e a um homem que estavam seguramente acima dos oitenta e nenhum deles teve dúvidas quanto à pedra de que falava.
Se por um lado isso mostra que a tradição de se atirar pedras à rocha estagnou e se ficou por determinada geração, isso parece ser negado pelo facto de, em bicos dos pés, conseguirmos descortinar vários calhaus pequenos em cima do penedo.
Pessoalmente, penso que se este hábito tivesse cessado há dezenas de anos atrás, não se veriam tantos pedregulhos por lá – pelo declive e exposição ao vento que o rochedo tem, a maioria já teria caído.
De resto, sejamos ou não cornudos, e queiramos ou não atirar-lhe pedrinhas, poderemos sempre dirigir-nos lá porque conhecer Travanca do Monte vale a pena.
Se corrermos a aldeia toda, passando o cemitério e deixando-o do nosso lado direito, há uma estrada de terra batida que nos dirige até ao penedo. Ele fica no limite norte da terra, e de lá, não havendo nevoeiro, temos vista desabrigada para as neves invernais da mítica Serra do Marão.”

Fontes: VortexMag.net e portugalnummapa.com
Miguel Moreira

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